PROCESSO N.º 928/18.1YRLSB.S1 Supremo Tribunal de Justiça

Data
20 de fevereiro de 2022

Descritores
Sociedade de advogados
Sócio
Exoneração
Participação social
Determinação do valor
Valor real
Amortização de quota
Comparticipação
Capital social
Abuso do direito
Venire contra factum proprium
Supressio
Tu quoque
Decisão arbitral

Sumário

I – O art. 21.º, n.º 8, do RJSA (aqui aplicável) estabelece que o sócio exonerado tem direito a receber da sociedade a quantia apurada nos termos previstos no contrato de sociedade ou em acordo escrito de todos os sócios.

II- No caso, as cláusulas dos estatutos da sociedade não fornecem um critério para a fixação do valor da participação de capital do sócio exonerado, limitando-se a remeter para a deliberação da Assembleia Geral.

III – Por seu turno, as regras societárias estabelecidas não constam de documento escrito assinado por todos os sócios da recorrida.

IV – Os factos provados não revelam uma manifestação de vontade directa e expressa de aceitação pelo colectivo de sócios da recorrente das regras societárias estabelecidas respeitantes à exoneração de sócio.

V – Por outro lado, só seria possível extrair uma declaração tácita de aceitação das regras societárias relativas à exoneração de sócios se existisse uma exteriorização escrita de todos os sócios, da qual se deduzisse, com toda a probabilidade, a vontade de aceitar, em concreto, essas regras de exoneração.

VI – Todavia, essa exteriorização não consta nem resulta dos factos provados ou dos documentos invocados pela recorrente.

VII – Tendo sido a recorrente quem inviabilizou a aplicação das regras societárias, ao não ter promovido a sua subscrição por todos os sócios, nem ter tomado as deliberações exigidas pelas cláusulas estatutárias, a pretensão formulada na acção pela recorrida, que pressupõe a não aplicação dessas regras sobre a exoneração, apesar de ter intervindo na sua aprovação, não configura um abuso do direito.

VIII – Afastada a aplicação das regras societárias e não fornecendo os estatutos da sociedade um critério para a fixação do valor da participação de capital, este valor teria de ser fixado com recurso à comissão arbitral – art. 21.º, n.os 9 e 10, que remete para as regras dos arts. 13.º e 17.º, todos do RJSA.

IX – Não resolvendo estas regras a questão do cálculo do valor da participação de capital para efeito de exoneração de sócios, tem de recorrer-se às normas do CC supletivamente aplicáveis, previstas, em especial, nos arts. 1021.º e 1018.º (art. 2.º do RJSA).

X – Decorre do disposto no art. 1021.º, n.º 1, do CC, que o sócio exonerado tem direito ao contravalor da participação, que corresponde à quota parte do valor da sociedade na data relevante.

XI – A determinação do valor da sociedade não pode limitar-se, num critério estático e atomista, a considerar os valores parcelares do activo líquido do património social que constam do balanço (critério contabilístico estrito).

XII – Por um lado, mesmo nessa perspectiva, sendo comum a subavaliação dos activos (desde logo, por aplicação do princípio do custo histórico, do princípio da prudência e pela existência de reservas ocultas), esses valores devem ser corrigidos para o seu valor real e efectivo.

XIII – Por outro lado, a esse valor patrimonial deve acrescer o valor que advém de activos imateriais ou intangíveis, da organização em si e da posição no mercado, ou seja, a reputação, notoriedade, relação com clientes e acreditamento no mercado, que integram o seu valor de aviamento (ou goodwill).

XIV – No caso, tratando-se de uma sociedade de advogados, mais se acentua esta vertente.

XV – Determinado o valor da sociedade, este deve ser repartido pelos sócios na proporção da parte que lhes corresponde nos lucros, em função do sistema de pontos que vigorava na sociedade, devendo deduzir-se o valor da clientela desviada (arts. 21.º, n.º 9, e 17.º, n.º 6, do RJSA).

Fonte: https://www.dgsi.pt




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