PROCESSO N.º 425/16.0BELLE Tribunal Central Administrativo Sul

Data
10 de dezembro de 2020

Descritores
Responsabilidade civil por atraso da justiça
Ilicitude e culpa da pessoa coletiva Estado
Danos indemnizáveis

Sumário
I. No ordenamento jurídico português vigente o direito de acesso à justiça em prazo razoável constitui uma garantia inerente ao direito ao acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional efetiva e que a infração a tal direito, extensível a qualquer tipo de processo, constitui o Estado em responsabilidade civil extracontratual.

II. Importa distinguir o exercício da função jurisdicional pelo titular do processo judicial que é o juiz, da organização e funcionamento do sistema público da administração da justiça, que pertence ao Estado português.

III. Verificam-se os pressupostos da responsabilidade civil do Estado, fundada em violação do direito a decisão em prazo razoável, comprovada a duração de ação administrativa e respetivo recurso jurisdicional durante cerca de 11 anos, num atraso na prolação da decisão judicial que se considera ser de cerca de 6 anos, por preenchimento dos requisitos da ilicitude e da culpa.

IV. Enquanto os danos não patrimoniaisimediatamente decorrentes da delonga processual se presumem, não carecendo de demonstração, os danos patrimoniais dependem quer de alegação, quer de prova.

V. O quantum da indemnização, a fixar equitativamente pelo Tribunal, de harmonia com o disposto no n.º 4 do artigo 496.º do CC, deverá atender ao tempo decorrido e às demais circunstâncias do caso, de entre as quais, a intensidade dos danos na esfera jurídica da Autora.

VI. Situando-se em média, em cerca de € 1.000, o valor de indemnização por ano de atraso no processo, este montante corresponde a uma média aritmética e não poderá, como tal, ser aplicado tout court, antes servindo de referencial a atender pelo julgador, que poderá aumentá-lo ou diminuí-lo, em função dos danos concretamente sofridos, segundo critérios de equidade.

VII. No que se refere às quantias peticionadas descritas como “Despesas de abertura de dossier, despesas administrativas e de expediente, taxas de justiça pagas pela Autora, despesas de certidões, todas as despesas de tradução de documentos;”, seria de as configurar como danos patrimoniais.

VIII. Tais despesas alegadas careciam de quantificação, por alegadamente já terem ocorrido e importarem um dano já produzido, cabendo à Autora alegar e provar cada uma dessas despesas, enquanto danos de natureza patrimonial, não havendo qualquer presunção de dano.

IX. No respeitante ao pagamento dos honorários com o advogado, há a distinguir se está em causa o ressarcimento de uma despesa imputável à delonga processual ou uma despesa com o processo de responsabilidade civil extracontratual do Estado por atraso da justiça.

X. No primeiro caso, os honorários de advogado apenas são suscetíveis de consubstanciar um dano indemnizável quando o seu valor aumente devido à delonga do processo judicial e na medida desse prolongamento excessivo, que carece de ser alegado e provado.

XI. No segundo caso, os honorários não constituem um dano indemnizável, apenas podendo ser considerados no âmbito das custas de parte, nos termos dos artigos 25.º, n.º 2, al. d) e 26.º, n.º 3, al. c) do Regulamento das Custas Processuais (RCP).

XII. Não é devida à Autora o pagamento de qualquer indemnização pelo pagamento de qualquer quantia que a mesma tenha de pagar a título de imposto, não sendo esta uma quantia indemnizável no âmbito do processo por atraso da justiça, por não se verificar o necessário requisito do nexo de causalidade.

Fonte: https://www.dgsi.pt




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