PROCESSO N.º 30/16.0T9CNT.C2-A.S1 Supremo Tribunal de Justiça

Data
25 de setembro de 2019

Descritores
Recurso para fixação de jurisprudência
Recurso de decisão contra jurisprudência fixada
Erro na forma do processo
Diversidade das normas jurídicas
Tramitação electrónica do processo

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Sumário
I – Alega o recorrente que o acórdão recorrido está em contradição com o Acórdão de Fixação de Jurisprudência (AFJ) n.º 3/2014, afirmando que o mesmo não caducou, invocando, no entanto, as disposições contidas nos artigos 437.º n.os 2 e 5 e 438.º n.os 1 e 2, do CPP, designando o recurso expressamente como recurso «EXTRAORDINÁRIO DE FIXAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA».

II – Sendo invocada a oposição entre o acórdão recorrido e um AFJ, entende-se que a referência ao recurso de fixação e ao artigo 437.º do CPP, se deve a um lapso: tendo presente o enquadramento fáctico e o fundamento invocado, estamos perante recurso contra jurisprudência fixada, previsto no artigo 446. Do CPP».

III – Perante uma situação de erro na forma de processo aqui evidenciada, e como tem entendido o STJ, a sua reparação é possível, conforme dispõe o artigo 193.º do Código de Processo Civil (CPC), aplicável ex vi artigo 4.º do CPP, sendo fácil adaptação dos termos do recurso interposto aos termos do recurso de decisão proferida contra jurisprudência fixada. Se um acórdão do Tribunal de Relação ou do STJ está em oposição com um AFJ, que é sempre deste último tribunal, essa situação é tratada à luz do art. 446.º do CPP, dando lugar a outro recurso extraordinário, o de decisão proferida contra jurisprudência fixada.

IV – Em face do disposto nos n.os 1, 2, e 3 do art. 446.º do CPP, é admissível recurso directo para o STJ – a interpor no prazo de 30 dias a contar do trânsito em julgado da decisão recorrida, pelo arguido, pelo assistente, pelas partes civis ou pelo MP, para quem é obrigatório – de qualquer decisão proferida contra jurisprudência fixada pelo mesmo STJ, que pode limitar-se a aplicar a jurisprudência já fixada, apenas devendo proceder ao seu reexame se entender que ela se encontra ultrapassada.

IV – Para além dos pressupostos formais enunciados na conclusão anterior, que ficaram referidos, exige-se ainda (a) a justificação da oposição entre os acórdãos (o fundamento e o recorrido) que motiva o conflito de jurisprudência; (b) a inalterabilidade da legislação no período compreendido entre a prolação das decisões conflituantes; (c) necessidade de a questão ser decidida em termos contraditórios de forma expressa; e (d) a identidade das situações de facto estar subjacente à questão de direito;

V – O AFJ n.º 3/2014 foi tirado com referência ao artigo 150.º, n.os 1 alínea d) e 2, do CPC/1961, na redacção Decreto-Lei n.º 324/2003 – que previa entre as formas da prática dos actos processuais escritos das partes, a remessa a juízo por correio electrónico –, e à Portaria n.º 642/2004 – que, além do mais, regulava aquela forma de prática de actos, preceitos e diploma que, pesem as alterações introduzidas no àquele artigo 150º pelo Decreto-Lei n.º 303/2007 – que, entre o mais, eliminaram a possibilidade da apresentação de peças por correio electrónico – e a substituição da Portaria n.º 642/2004 pela Portaria n.º 114/2008, o acórdão uniformizador considerou sobrevigentes em processo penal, por isso que fixando interpretação no sentido de continuar a ser permitido nesse contexto a remessa a juízo de peças processuais por correio electrónico.

VI – Acontece todavia que o CPC/1961 foi revogado e substituído, a partir de 1.9.2013 pelo CPC/2013, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, cujo artigo 144º optou pela transmissão electrónica de dados como forma exclusiva da prática dos actos escritos das partes em juízo – n.os 1 a 6 da norma, em articulação com o artigo 132.º n.º 1 do mesmo diploma e com a Portaria n.º 280/2013, de 26 de Agosto –, com a única derrogação de, não sendo obrigatória a constituição por advogado e não estando o interessado patrocinado, se permitir a entrega das peças em mão na secretaria judicial, a remessa delas por correio registado ou o seu envio por telecópia – n.º 7 do preceito.

VII – O que significa que o quadro legal que relevou na decisão recorrida foi o decorrente do CPC/2013 e da Portaria n.º 280/2013 referida, esta na redacção da Portaria n.º 170/2017, de 25 de Maio, tudo por referência à data de 1.6.2018 aqui relevante, não tendo sido aquele em que se moveu o citado AFJ n.º 3/2014, pelo que se mostra excluído o pressuposto da identidade da questão de direito tratada num e noutro.

VIII – Não existindo essa identidade normativa nas situações apreciadas no acórdão recorrido e no acórdão fundamento, torna-se evidente que são também diferentes as pronúncias em termos de direito, o que afasta, a integração do pressuposto substancial da oposição de julgados, pelo que o recurso interposto, convolado para recurso de decisão proferida contra jurisprudência fixada, deve ser rejeitado, nos termos do disposto nos artigos 446.º, n.º 1, 437.º e 441.º, n.º 1, do CPP.

Fonte: https://www.dgsi.pt

 




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