PROCESSO N.º 293/15.9T9BGC.G1 Tribunal da Relação de Guimarães

Data
12 de outubro de 2020

Descritores
Processo Penal
Princípio da Suficiência
Questão Prejudicial
Fundamentação da Sentença
Pedido Cível

Sumário
I – A norma do art. 7º, n.º 1, do CPP, prevenindo a ocorrência de obstáculos ao exercício da acção penal, consagra o “princípio da suficiência”, segundo o qual o processo penal é promovido independentemente de qualquer outro e nele se resolvem todas as questões que interessarem à boa decisão da causa, com vista a garantir a sua concentração e continuidade.

II – Ainda que quanto a qualquer questão prejudicial não penal o tribunal penal assuma sempre a competência normal de outros tribunais, decorre do n.º 2 desse preceito que o referido princípio comporta a possibilidade de o tribunal penal suspender o processo para devolver o seu conhecimento ao tribunal competente quando conclua que uma tal questão não possa ser convenientemente resolvida no processo penal.

III – A decisão de suspensão para conhecimento de questão prejudicial, embora discricionária, terá de ser fundamentada numa relação de necessidade com o conhecimento do crime e numa relação de conveniência.

IV – Nos termos do artigo 374.º, n.º 2 do CPP, na sentença deve constar, sob pena de nulidade, a enumeração dos factos provados e não provados, de forma clara, precisa e inequívoca, enquanto tomada de posição pelo tribunal sobre todos os factos sujeitos à sua apreciação e em relação aos quais a decisão terá de incidir, nos termos previstos no artigo 368.º, n.º 2: relativamente ao âmbito material desse enunciado, prescreve o art. 339º, n.º 4 que a discussão da causa tem por objecto os factos alegados pela acusação, os factos alegados pela defesa e os factos que resultarem da discussão da causa, tendo em vista as finalidades a que se referem os artigos 368.º (questão da culpabilidade) e 369.º (questão da determinação da sanção), sem prejuízo do regime aplicável à alteração dos factos (arts. 358º e 359º).

V – Todavia, «o cumprimento do disposto no artigo. 374º, nº 2, do C. P. Penal, não impõe a enumeração dos factos não provados que sejam irrelevantes para a caracterização do crime e/ou para a medida da pena, sendo certo que essa irrelevância deve ser vista com rigor, em função do factualismo inerente às posições da acusação e da defesa e bem assim aos contornos das diversas possibilidades de aplicação do direito ao caso concreto». É o que sucede quando a versão apresentada pelo arguido na contestação constitua mera negação, embora especificada, da conduta que lhe é imputada na acusação e, por imperativo lógico, impassível de demonstração, uma vez que equivale ao oposto do que o Tribunal a quo considerou provado na sentença.

VI – Em processo penal, é legítimo o recurso a presunções simples ou naturais, na medida em que são admissíveis as provas que não forem proibidas por lei (art. 125.º do CPP), o que sucede com as presunções, que o art. 349.º do CC qualifica como as ilações que a lei ou o julgador retira de um facto conhecido para afirmar um facto desconhecido, sendo admitidas as presunções judiciais nos casos e termos em que é admitida a prova testemunhal (art. 351.º do mesmo Código).

VII – O pedido de natureza cível fundamentado na alegada responsabilidade subjectiva do demandado haverá que ser apreciado à luz do disposto na lei civil (art. 129º do C. Penal).

VIII – Daí que a simples mora no cumprimento da obrigação da reparação do dano de ‘capital’, gerado pela prática do crime de abuso de confiança, constitui o devedor na obrigação de reparar os danos causados ao credor, cuja indemnização corresponde aos juros de mora (cf. arts. 804º a 806º do CC): na obrigação pecuniária fundada em responsabilidade por facto ilícito, essa indemnização corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora e esta ocorre desde a prática do facto se a obrigação não depender de qualquer liquidação, como sucede quando estão em causa quantias certas e líquidas.

Fonte: https://www.dgsi.pt




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