PROCESSO N.º 27885/16.6T8LSB.A.L1-1 Tribunal da Relação de Lisboa

Data
24 de novembro de 2020

Descritores
Processo de insolvência
Verificação e graduação de créditos
Carácter instrumental
Lista de créditos reconhecidos
Administrador da insolvência
Efeito cominatório
Impugnação
Princípio da reserva jurisdicional

Sumário
I – Os créditos reconhecidos sob a condição resolutiva do seu não pagamento num outro processo de insolvência onde foram também reclamados, extinguem-se na medida do pagamento que dos mesmos seja efetuado no âmbito desse mesmo processo, a comprovar nos termos do art. 179º, nº 1 do CIRE.

II – As especificidades que destacam o incidente de verificação e graduação de créditos na insolvência do regime geral do processo comum declarativo decorrem: do caráter instrumental da sentença ali proferida relativamente ao objeto legal do processo de insolvência (lato senso), do facto de este ser cumprido através dos autos principais e de outros apensos (vg. apreensão de bens e liquidação) e, de sobremaneira, do facto de o ato processual que instaura o apenso de verificação e graduação de créditos corresponder à lista de créditos reconhecidos devida elaborar e apresentar pelo Administrador da Insolvência que, num paralelismo com as peças processuais do processo declarativo comum, equivalerá à petição inicial e que, a par com o regime de prazos legais sucessivos e a prolação de sentença homologatória em caso de ausência de impugnações, conduz a óbvia simplificação processual de carácter administrativo da tramitação legal daquele incidente.

III – Por referência ao papel, constitucionalmente inderrogável, do exercício da atividade jurisdicional enquanto garante da legalidade das matérias acobertadas pelas decisões e da composição dos conflitos de interesses em conformidade com o direito aplicável (cfr. arts. 20º, nº 1 e 202º, nº 2 da CRP), a sindicância do erro manifesto previsto pelo art. 130º, nº 3 do CIRE deve interpretar-se em termos amplos, encarando-a como o exercício de um poder-dever do Juiz para, no confronto com o que consta da própria lista ou do que resulta dos elementos disponíveis nos autos de insolvência (lato senso), verificar a conformidade substancial e formal dos créditos inscritos na lista que vai homologar, se necessário for, solicitando ao Administrador da Insolvência todos os esclarecimentos e elementos que para o efeito se revelem necessários, e, em qualquer caso, sem prejuízo do cumprimento do pertinente contraditório se da referida oficiosidade resultar alteração ao teor da lista de créditos tal qual como a mesma foi apresentada pelo Administrador da Insolvência.

IV – Com a devida adaptação à natureza e origem do ato a que reportam – lista de créditos elaborada pelo Administrador da Insolvência investido na qualidade de sujeito processual supra-partes, e impugnação à lista de créditos articulada por parte interessada, devedor e/ou credor – o resultado visado prevenir com a ressalva de erro manifesto prevista pelo art. 130º, nº 3, por força do princípio constitucional da reserva jurisdicional que lhe subjaz, é  extensível ao art. 131º, nº 3 do CIRE, impondo limites ao efeito cominatório por este previsto, no sentido de serem julgadas improcedentes as pretensões deduzidas em sede de impugnação à lista que correspondam ou conduzam a erros manifestos – de facto ou de direito –, sob pena, novamente, de violação do princípio da reserva jurisdicional e do papel de controlo da legalidade em que por ele é institucionalmente investido o magistrado judicial.

V – A salvaguarda do princípio da reserva jurisdicional na realização do direito e da justiça – através da composição dos conflitos de interesses de harmonia com o direito vigente -, não se compatibiliza com decisões judiciais cujo sentido seja exclusiva e positivamente determinado por efeito de osmose com a pretensão plasmada no dispositivo do petitório de um dos sujeitos do litígio, pelo que, não basta aos credores, para serem satisfeitos, manifestarem a sua pretensão, é preciso que esta seja uma pretensão juridicamente protegida.

Fonte: https://www.dgsi.pt

 




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