PROCESSO N.º 2083/20.8BELSB Tribunal Central Administrativo Sul

Data
2 de junho de 2021

Descritores
Contencioso pré-contratual
Dever de adjudicação
Ato de não adjudicação
Pandemia pela COVID 19
Circunstâncias supervenientes
Perda do interesse em contratar

Sumário
I. Aferido o respeito pelas exigências legais colocadas ao impugnante do julgamento da matéria de facto, a relevância dos factos alegados e sua comprovação por meios de prova, será de aditar factos ao julgamento da matéria de facto.

II. Comprovada a situação de pandemia e a declaração do estado de emergência em momento posterior à decisão de contratar e de apresentação de propostas pelos concorrentes, verificam-se circunstâncias supervenientes em relação à decisão de contratar.

III. Estabelece o artigo 79.º, n.º 1, d) do CCP, que não há lugar a adjudicação, extinguindo-se o procedimento, quando circunstâncias supervenientes relativas aos pressupostos da decisão de contratar o justifiquem.

IV. O artigo 76º, nº 1 do CCP, além de estabelecer o dever de adjudicação, cuidou de prever os termos em que a decisão deve ser tomada e ainda as consequências do seu incumprimento.

V. Salvo a ocorrência de circunstâncias que determinam a não adjudicação, previstas nas várias alíneas do nº 1 do artigo 79º do CCP, a entidade adjudicante tem o dever legal de adotar a decisão final do procedimento pré-contratual num determinado prazo.

VI. Não existe um poder discricionário em torno da decisão de adjudicação, sendo de recusar que a entidade adjudicante disponha da liberdade de adjudicar ou de não adjudicar, antes estando em causa uma decisão vinculada, em que existe o dever de adjudicação, salvo a verificação de um dos eventos típicos, previstos na lei de forma expressa, que legitimam a não adjudicação.

VII. Estando em causa a previsão legal das circunstâncias em que a entidade adjudicante pode licitamente não adjudicar, a decisão de não adjudicação não deixa de estar sujeita ao princípio da legalidade e ao escrutínio do juiz na verificação dos respetivos pressupostos factuais e de Direito.

VIII. Tal decisão, como ato administrativo que é, está sujeita ao dever de fundamentação, na dupla perspetiva de fundamentação formal (enquanto vício de forma) e fundamentação substantiva (de controle do eventual erro grosseiro do mérito da decisão de não adjudicação cometido) para além da admissibilidade, como regra, da sindicabilidade dos conceitos jurídicos indeterminados.

IX. Sendo o estado de pandemia no país e a declaração de estado de emergência circunstâncias novas e supervenientes à decisão de contratar, que não foram previstas pela entidade adjudicante, admitindo que fossem mesmo imprevisíveis, não resulta que as mesmas, apesar de ocorrerem, puseram em causa a razão de ser ou os pressupostos da decisão de contratar.

X. Admitindo a superveniência dos factos invocados pela entidade adjudicante como justificando a não adjudicação, já não se mostram demonstrados factos donde resultem a perda do interesse em contratar.

XI. A decisão de não adjudicação fundada na al. d) do n.º 1 do artigo 79.º do CCP configura uma derrogação ao dever de adjudicar consagrado no artigo 76.º. do CCP e sendo convocada a ocorrência de circunstâncias supervenientes e imprevistas para não adjudicar, não pode a entidade adjudicante refugiar-se numa margem de discricionariedade para, sem uma justificação devidamente alicerçada no plano factual, pretender furtar-se ao cumprimento do dever imposto pelo artigo 76.º do CCP.

Fonte: https://www.dgsi.pt




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