PROCESSO N.º 1859/20.0T8BRG.G1 Tribunal da Relação de Guimarães

Data
23 de junho de 2021

Descritores
Responsabilidade civil do advogado
Perda de chance
Probabilidade de concretização da vantagem
Nexo de causalidade

Sumário

I- Entre as obrigações do Advogado não está a de ganhar a causa, mas apenas a de defender os interesses do mandante com todo o seu saber, diligentemente, segundo as regras da arte, com o objetivo de vencer a lide, visto tratar-se de uma obrigação de meios, e não de resultado.

II- O incumprimento dos referidos deveres por parte do Advogado constituído pode implicar responsabilidade civil contratual pelos danos daí decorrentes para o mandante.

III- Na ação destinada a efetivar essa responsabilidade civil do Advogado deve o lesado demonstrar que existia uma probabilidade séria e real de a sua pretensão ter sido reconhecida, caso o mandante tivesse atuado com a diligência devida, o que implica fazer o chamado “julgamento dentro do julgamento”, atentando no que poderia ser considerado como altamente provável pelo tribunal da causa.

IV- Esse julgamento dentro do julgamento implica dar resposta a uma questão hipotética, no caso a de saber se os Advogados ora réus tivessem, na sua reclamação de créditos, invocado a favor da sociedade mandante o direito de retenção, nos termos supra referidos, qual seria a probabilidade de obterem uma graduação do crédito diferente da que obtiveram?

V- A jurisprudência operou uma interpretação restritiva do disposto no art. 755º,1,f CC, de tal forma que o direito de retenção apenas pode ser reconhecido ao beneficiário da promessa de transmissão ou constituição de direito real que obteve a tradição da coisa a que se refere o contrato prometido, sobre essa coisa, pelo crédito resultante do não cumprimento imputável à outra parte, nos termos do artigo 442º, se o mesmo puder ser considerado consumidor.

VI- Uma sociedade comercial, a não ser em condições absolutamente excepcionais, não pode ser considerada consumidora, e como tal não beneficia do direito de retenção referido.

VII- Donde, o julgamento dentro do julgamento, como juízo de prognose, inerente à valoração da chance aponta para a inexistência de uma oportunidade de ganhar, consistente, plausível, que se haja perdido pela omissão cometida pelos primeiros réus, enquanto mandatários da sociedade, ao reclamar os créditos desta.

VIII- E assim, mesmo que os Advogados réus tivessem invocado o direito de retenção a favor da sua cliente sociedade, a probabilidade de daí ter emergido um resultado diferente daquele que emergiu era quase nula.

IX- Daí, inexiste nexo de causalidade entre o facto (no caso a omissão) e o dano, pois aquele “dano” em concreto sempre se produziria, mesmo que não tivesse havido omissão por parte dos réus Advogados.

Fonte: https://www.dgsi.pt




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