PROCESSO N.º 1807/19.0YRLSB-7 Tribunal da Relação de Lisboa

Data
11 de dezembro de 2019

Descritores
Revisão de sentença estrangeira
União estável
Brasil
Escritura pública

Sumário
I. Na ordem jurídica brasileira, a união estável é erigida à qualidade de entidade familiar, podendo ser constituída por escritura pública perante tabelião de notas, constituindo essa escritura um verdadeiro contrato, designadamente com disposições sobre as relações patrimoniais entre os companheiros. Esse contrato pode ser objeto de registo, colhendo então efeitos perante terceiros.

II. A lei processual brasileira equipara a extinção consensual da união estável aos casos de divórcio consensual, podendo efetuar-se todos por escritura pública, a qual não depende de homologação judicial.

III. À nossa ordem jurídica não é estranha a noção de um «órgão jurisdicional»  que consista em profissional do direito que aja sob o controlo de um tribunal, desde que ofereça garantias no que respeita à sua imparcialidade e ao direito de todas as partes a serem ouvidas, e desde que as suas decisões nos termos da lei do Estado-Membro onde estão estabelecidos possam ser objeto de controlo por um tribunal e tenham força e efeitos equivalentes aos de uma decisão de um tribunal na mesma matéria (art. 3º, nº2, do Regulamento nº 2016/1104, do Conselho de 24.6.2016, atinente às parcerias registadas).

IV. Sendo admissível a formalização da união estável no Brasil através de escritura pública perante tabelião, a intervenção e controle feitos pelo tabelião consubstanciam a intervenção de uma entidade administrativa que cauciona o ato, ao qual são atribuídos efeitos precípuos pela ordem jurídica brasileira.

V. A intervenção do notário/tabelião de notas, no âmbito da escritura da união estável, é ainda uma intervenção integrante de uma função pública transferida pelo Estado por meio de delegação administrativa sui generis, assumindo a intervenção do notário a natureza de caucionamento do ato em causa.

VI. A intervenção notarial permite que o ato despolete efeitos na ordem jurídica brasileira, tal como se tivesse sido objeto de declaração judicial em sentido estrito, estando mesmo a atividade notarial sujeito à fiscalização do Poder Judiciário. Em suma, a outorga da escritura de união estável perante o notário, a função deste e o controlo da atividade notarial pelos tribunais no Brasil são suscetíveis de equivaler aos requisitos de ato jurisdicional impostos pelo art. 3º, nº2, do Regulamento nº 2016/2014, do Conselho de 24.6.2016, tendo a intervenção de oficial público repercussão performativa na ordem jurídica em que é prevista e praticada.

VII. Por todas estas razões, deve admitir-se a revisão de escritura pública de união estável realizada no Brasil.

Fonte: https://www.dgsi.pt




O Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados disponibiliza a presente newsletter. Esta compilação não pretende ser exaustiva e não prescinde a consulta das versões oficiais destes e de outros textos legais.