PROCESSO N.º 1238/20.OT8PTG.E1.S1 Supremo Tribunal de Justiça

Data
24 de fevereiro de 2022

Descritores
Arrendamento rural
Compropriedade
Divisão de coisa comum
Extinção do contrato
Oposição à renovação
Denúncia
Inconstitucionalidade
Propriedade privada
Ato inútil
Sanação oficiosa de erro no procedimento
Recurso subordinado
Ampliação do âmbito do recurso
Recurso independente
Convolação
Correcção oficiosa

Sumário
I. Nas situações em que foram deduzidos um pedido principal e um pedido subsidiário, a parte vencedora da ação se pretender sindicar a decisão do pedido principal, que foi julgado improcedente, deverá fazê-lo através da interposição de um recurso independente ou subordinado, nos termos do artigo 633º, do Código de Processo Civil e não mediante uma ampliação do âmbito do recurso, nos termos do artigo 636º, do mesmo código.

II. O artigo 193º, nº 3, do Código de Processo Civil, tem por objeto a correção do erro cometido pela parte quanto ao meio processual utilizado para a prática de determinado ato, caso em que se impõe ao tribunal a convolação oficiosa do ato indevidamente qualificado pela parte para o meio processual de que deveria ter-se socorrido, desde que o seu conteúdo seja adequável com este último.

III. Tendo a autora, por erro de qualificação, requerido nas alegações da sua resposta a ampliação do âmbito do recurso quanto ao pedido principal de resolução do contrato de arrendamento com fundamento na falta de pagamento de rendas, cuja decisão lhe foi desfavorável, mas resultando claro do teor dessas alegações que a mesma pretendia a reapreciação daquele pedido, recai sobre o tribunal o dever de convolar, oficiosamente, a requerida ampliação do âmbito do recurso em recurso subordinado, a não ser que tal convolação se venha a traduzir na prática de um ato inútil.

IV. O contrato de arrendamento rural de prédio rústico pertença de dois comproprietários não é afetado pela extinção da compropriedade operada por via de ação de divisão de coisa comum.

V. É relativamente à totalidade do prédio objeto do contrato de arrendamento rural e não apenas a uma parte dele que se poderá fazer valer a oposição à renovação ou denúncia por iniciativa do locador, tal como resulta do estabelecido no artigo 19º, nº 2, do DL n.° 294/2009, de 13/10.

VI. É que se assim não fosse deixaríamos nas mãos do locador a possibilidade de reduzir unilateralmente o objeto do contrato de arrendamento rural, nomeadamente a área do prédio locado, o que, para além de frustrar o resultado prático que se pretendeu alcançar com a celebração do contrato de arrendamento, sempre redundaria na modificação unilateral do objeto do contrato, em violação do princípio da pontualidade inserto no artigo 406.° n.° 1 do Código Civil e numa extinção parcial do contrato através de oposição à renovação ou denúncia por iniciativa do locador, não consentida pelo  nº 2 do citado artigo 19º.

VII. A interpretação da norma deste artigo 19º, nº 2 no sentido de que o âmbito da cessação por oposição à renovação e por denúncia de uma das partes abrange obrigatoriamente todo o objeto do contrato, não podendo a oposição à renovação do contrato nem a denúncia ser invocadas de forma parcial, não interfere com o núcleo essencial do direito de propriedade dos senhorios que continuam a extrair do imóvel o proveito económico que corresponde a uma forma típica de exploração dos prédios rústicos, não constituindo, por isso, violação do princípio constitucional do direito à propriedade privada consagrado no artigo 62º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa.

Fonte: https://www.dgsi.pt




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