PROCESSO N.º 109/19.7TELSB-C.P1 Tribunal da Relação do Porto

Data
10 de março de 2021

Descritores
Decisão europeia de investigação
Carta rogatória
Suspensão de prazos processuais
Lei de emergência

Sumário

I – O n.º 5 do art. 276º do Cód. Proc. Penal prescreve: “Em caso de expedição de carta rogatória, o decurso dos prazos previstos nos n.ºs 1 a 3 suspende-se até à respectiva devolução, não podendo o período total de suspensão, em cada processo, ser superior a metade do prazo máximo que corresponder ao inquérito”.

II – A carta rogatória e a DEI são instrumentos de comunicação entre serviços de justiça e entre autoridades judiciárias transnacionais, com vista à prática de actos processuais no estrangeiro, apenas divergindo a denominação por virtude da primeira estar consagrada no art. 111º, n.º 3, al. b), do Cód. Proc. Penal, e a segunda ter sido estabelecida em diploma de cooperação judiciária internacional, densificando uma designação comum a vários Estados;

III – Conquanto exista alguma similitude de fins entre cartas rogatórias e DEI, aquelas têm um âmbito e finalidades bem mais extensos e complexos, não se limitando à realização, a pedido do Estado de Emissão pelo Estado de Execução, de uma ou várias medidas específicas de investigação tendo em vista a recolha de elementos de prova, sendo também diversos os trâmites de aceitação e cumprimento de ambas.

IV – A pretendida interpretação actualista não se compagina harmonicamente com a circunstância do legislador, entre Agosto de 2017 e Agosto de 2020, ter introduzido variadas alterações a normas do Código de Processo Penal, mas deixando sempre intocado o controvertido n.º 5, do art. 276º, razão porque este preceito não é aplicável às DEI como causa de suspensão do prazo de inquérito.

V – As DEI constituem uma nova abordagem na recolha de prova no âmbito da criminalidade transfronteiriça, criando um sistema mais simples, com transmissão directa pela autoridade de emissão à autoridade de execução e comunicação também directa entre ambas (v. art. 13º, n.ºs 1 e 3, da Lei n.º 88/2017) e prazos limite curtos, tudo para garantir que a cooperação em matéria penal entre os Estados aderentes seja rápida, eficaz e coerente.

VI – Neste conspecto, é manifesto que as DEI se constituem como instrumento de superação das dificuldades e lentidão características do sistema baseado na emissão de cartas rogatórias, razão que determina o afastamento da associação entre ambos os instrumentos para justificar a inscrição das primeiras também como causa de suspensão.

VII – A Lei n.º 1-A/2020, de 19 de Março, impôs que todos os prazos para a prática de actos processuais e procedimentais que devam ser praticados no âmbito dos processos e procedimentos que corram termos nos tribunais judiciais, tribunais administrativos e fiscais, Tribunal Constitucional, Tribunal de Contas e demais órgãos jurisdicionais, tribunais arbitrais, Ministério Público, julgados de paz, entidades de resolução alternativa de litígios e órgãos de execução fiscal ficam suspensos até à cessação da situação excepcional de prevenção, contenção, mitigação e tratamento da infecção epidemiológica por SARS-CoV-2 e da doença COVID-19, a decretar nos termos do número seguinte.

VIII – O seu n.º 3 estatui que “A situação excecional constitui igualmente causa de suspensão dos prazos de prescrição e de caducidade relativos a todos os tipos de processos e procedimentos”, acrescentando no n.º 4 seguinte que tal disposição prevalece “sobre quaisquer regimes que estabeleçam prazos máximos imperativos de prescrição ou caducidade, sendo os mesmos alargados pelo período de tempo em que vigorar a situação excepcional.

IX – O citado diploma legal não só densificou um conceito alargado de “acto processual”, de molde a abranger os actos praticados dentro e fora do processo, como contemplou mesmo prazos substantivos, no sentido de alcançar com a sua previsão todas as situações possíveis.

Fonte: https://www.dgsi.pt




O Conselho Regional de Lisboa da Ordem dos Advogados disponibiliza a presente newsletter. Esta compilação não pretende ser exaustiva e não prescinde a consulta das versões oficiais destes e de outros textos legais.