PROCESSO N.º 5455/15.6T8LSB.L1.S1 Supremo Tribunal de Justiça

Data
08 de julho de 2020

Descritores
Contrato de arrendamento
Subarrendamento
Obras
Autorização
Autonomia privada
Obras de conservação ordinária
Obras de conservação extraordinária
Deterioração
Reparações urgentes
Declaração tácita
Presunção
Matéria de facto
Matéria de direito
Poderes do Supremo Tribunal de Justiça
Benfeitorias voluptuárias
Arrendamento urbano
Prova documental
Prova testemunhal
Valor probatório

Sumário

I – Aplicam-se ao subarrendamento as regras do arrendamento.

II – Prevendo o contrato uma finalidade principal e outra acessória, prevalece o regime aplicável à principal (n.º 3 do art. 1028.º do CC).

III – O regime previsto pelo NRAU, aprovado pela Lei n.º 6/2006, de 27-02, para as obras a realizar em prédios urbanos arrendados pode ser afastado por convenção das partes.

IV – Salvo convenção em contrário, cabe ao senhorio a responsabilidade pelas obras de conservação, sem distinções (n.º 1 do art. 1074.º do CC).

V – Por princípio, está vedada ao arrendatário a realização de obras, salvo “quando o contrato o faculte” ou mediante autorização escrita do senhorio (n.º 2 do art. 1074.º do CC), ou ainda ressalvadas as hipóteses previstas no art. 1036.º (reparações urgentes) e, desde a Lei n.º 13/2019, de 20-02, no art. 22.º-A do DL n.º 157/2006, de 08-08, como resulta do (actual) n.º 3 do art. 1074.º.

VI – O arrendatário tem a obrigação de reparar as “deteriorações lícitas” (art. 1073.º) “antes da restituição do prédio”; sendo que são lícitas, para este efeito, “pequenas deteriorações no prédio arrendado que se tornem necessárias para assegurar o seu conforto ou comodidade”.

VII – São também lícitas as deteriorações decorrentes de uma prudente utilização, em conformidade com os fins do contrato” (n.º 1 do art. 1043.º).

VIII – São ilícitas as deteriorações que excedem estes limites, e que podem constituir o arrendatário na obrigação de indemnizar o senhorio (art. 1044.º).

IX – Distintas das deteriorações, lícitas ou ilícitas, a que se referem os arts. 1073.º e 1044.º, são as obras, que também podem ser lícitas ou ilícitas.

X – São lícitas as obras devidamente autorizadas e que, salvo estipulação em contrário, conferem ao arrendatário direito a compensação, nos termos aplicáveis às benfeitorias realizadas pelo possuidor de boa fé (n.os 2 e 5 do art. 1074.º).

XI – Ressalvadas as situações de urgência, as demais serão ilícitas, sendo aplicável o regime geral da locação (art. 1046.º) e o arrendatário tratado como possuidor de má fé.
XII – A autorização escrita prevista no n.º 2 do art. 1074.º do CC não é exigida como requisito de forma da declaração mas sim como requisito de prova, destinando-se a proteger as partes uma em relação à outra.

XIII – Autorização escrita não significa necessariamente autorização expressa.
XIV – As declarações tácitas assentam numa presunção: de factos tidos por concludentes, o julgador deduz um significado declarativo, que se alcança por via interpretativa.
XV – O n.º 2 o art. 217.º, ao admitir uma declaração tácita extraída dos factos concludentes relativamente aos quais foi observada a forma legal, está a permitir uma declaração formal extraída por presunção conjugada com factos-base que respeitaram a forma exigida; se essa conjugação é eficaz quanto a requisitos de forma, por maioria de razão o será quando a redução a escrito é apenas um requisito de prova.

XVI – Do n.º 2 do art. 364.º do CC, lido em conjunto com o n.º 1 do art. 393.º e com o art. 351.º, resulta o afastamento de testemunhas ou presunções para substituição do documento exigido para efeitos de prova. No entanto, em situações semelhantes o STJ tem entendido que a prova testemunhal – e, por arrastamento permitido pela forma como a lei as associa, a prova por presunções – pode ser utilizada como complemento de outros meios de prova, máxime de documentos.
XVII – No caso, as instâncias consideraram que a realização de uma vistoria sem que a senhoria tenha reagido às alterações consubstancia uma aprovação tácita das obras; o significado desse facto considerado concludente pelas instâncias é matéria de facto, não cabendo no âmbito da competência do STJ o respectivo controlo.

XVIII – Saber se pode valer como declaração tácita é matéria de direito, já cabendo na competência do STJ controlar a aplicação dos critérios legais de interpretação, como se fosse expressa.
XIX – Vem provado que o projecto de obras de adaptação para a prestação de aulas de culinária foi enviado à recorrente e que não houve autorização escrita; que a senhoria, através de uma empresa contratada para o efeito, fez (neste sentido) uma vistoria ao imóvel, verificando as alterações; que, já perto do termo do contrato, a senhoria enviou uma carta a perguntar ao arrendatário como ia repor o imóvel no estado em que se encontrava, enviando o relatório da empresa.
XX – Conjugando a presunção retirada nas instâncias com o texto do contrato, com o projecto enviado e com a carta do arrendatário identificada no acórdão, encontramos elementos documentais suficientes para, entendidos em conjunto com a vistoria do imóvel, possibilitar a dedução de que a senhoria aprovou tacitamente as obras de adaptação do 1.º piso para as aulas de culinária.

XXI – A validade dos acordos verbais anteriores ao contrato escrito de sub-arrendamento afere-se pelo disposto no art. 221.º do CC.

XXII – Aos melhoramentos acordados por essa forma é aplicável o regime das benfeitorias voluptuárias autorizadas.

Fonte: https://jurisprudencia.csm.org.pt




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