PROCESSO N.º 2949/15.7T8VFX-B.L1.S1 Supremo Tribunal de Justiça
Data
5 de abril de 2022
Descritores
Contrato-promessa de compra e venda
Declaração de insolvência
Incumprimento do contrato
Incumprimento definitivo
Consumidor
Acórdão uniformizador de jurisprudência
Votação
MAIORIA COM * VOT VENC
Sumário
I – A uniformização jurisprudencial constante do AUJ 4/2014 não é aplicável quando se está perante contratos-promessa que haviam já cessado antes da declaração de insolvência da promitente-vendedora, ou seja, tal uniformização jurisprudencial aplica-se apenas aos contratos-promessa que, no momento da declaração de insolvência da promitente-vendedora, forem ainda “negócios em curso”.
II– Não são “negócios em curso” os contratos-promessa de compra e venda já resolvidos antes da declaração de insolvência e/ou aqueles cujo cumprimento, à data da declaração de insolvência, estava já impossibilitado.
III – O que – estar o cumprimento do contrato-promessa de compra e venda impossibilitado – não se confunde nem com o saber/apurar se assistia, à data da declaração de insolvência, o direito à resolução contratual por parte do promitente comprador nem com o saber/apurar se, à data da declaração de insolvência, havia incumprimento definitivo por parte da promitente vendedora/insolvente.
IV – Produzidos uma declaração ou comportamento que mostre a intenção categórica do devedor não cumprir, o devedor, que assim procede, provoca o incumprimento, sem que, porém, se extinga o seu dever de prestação – razão por que o credor continua a poder a exigir o cumprimento, a poder pedir a execução específica se nisso ainda tiver interesse, assim como pode exercer o direito de resolução – ou seja, para efeito do art. 102.º, n.º 1, do CIRE, continuamos perante um “negócio em curso”, uma vez que o comportamento demonstrativo da vontade de não cumprir, caso configure incumprimento definitivo, não faz sem mais e “automaticamente” o contrato cessar, sendo antes pressuposto de consequências jurídicas imediatas, como as referidas exigibilidade do cumprimento, execução específica do contrato-promessa ou resolução do contrato.
V – No AUJ 4/2019, apenas esteve em causa – e só em relação a isso foi uniformizada jurisprudência – o conceito do elemento subjetivo ativo do ato de consumo, ou seja, o AUJ 4/2019 não veio dizer que se deve prescindir da componente relacional típica da noção jurídica de consumidor, componente relacional esta que pressupõe a existência de uma determinada contraparte dos atos ou relações de consumo, sendo que tal contraparte, segundo o art. 2.º, n.º 1, in fine da Lei do Consumidor, deverá ser uma pessoa que exerça com caráter profissional uma atividade económica que vise a obtenção de benefícios, o mesmo é dizer, alguém (um empresário ou profissional) que desenvolva uma atividade económica dirigida a qualquer tipo de vantagem patrimonial, atividade económica essa exercida com caráter profissional.
VI – Ficam assim – por faltar o elemento relativo ao sujeito passivo ou contraparte do ato de consumo – excluídos do conceito jurídico de consumidor as relações em que o sujeito passivo do ato de consumo é um individuo que não exerce qualquer atividade económica profissional; isto é, ficam excluídos todos os contratos-promessa de compra e venda celebrados entre particulares.
Fonte: https://www.dgsi.pt