PROCESSO N.º 499/18.9YRLSB.S1 Supremo Tribunal de Justiça
Data
15 de julho de 2020
Descritores
Extradição
Arguição de nulidades
Omissão de pronúncia
Excesso de pronúncia
Indeferimento
Sumário
I – Notificado do acórdão proferido em 22 de Abril de 2020, constante de fls. 1210 a 1273 destes autos, que negou provimento ao recurso interposto pelo cidadão chinês AA, confirmando o acórdão recorrido do Tribunal da Relação de Lisboa de 28-11-2019, constante de fls. 991 a 995, complementado pelo acórdão de 9-01-2020, constante de fls. 1121 a 1123, que indeferiu o pedido de declaração de irregularidades apresentado pelo recorrente, e autorizou a extradição do mesmo para a República Popular da China, vem o aludido AA, ao abrigo do disposto nos artigos 379.º, n.º 1, alínea c), 380.º, n.º 1, alínea b), aplicáveis ex vi do artigo 425.º, n.º 4, e do artigo 105.º, n.º 1, todos do Código de Processo Penal, arguir a respectiva nulidade.
Apreciando.
II – 1 – Cláusula Humanitária – Pontos 1 a 10.
A propósito desta questão, versando o artigo 4.º, alínea b), do Tratado entre a República Portuguesa e a República Popular da China sobre Extradição, e o artigo 18.º, n.º 2, da Lei n.º 144/99, exposta nas conclusões L a DD, foram no acórdão de 22-04-2020 citados acórdãos deste Supremo Tribunal onde se perfila questão de inconstitucionalidade.
A primeira norma reporta pessoa reclamada e a segunda pessoa visada, não estando em causa consequências ao nível da idade (actualmente o recorrente conta 49 anos de idade) e da saúde do requerido, aliás, não alegadas.
III – A propósito da invocação de versão incorrecta do artigo 135.º da Lei n.º 23/2007, consta do ponto 10: “ Ora, o Recorrente invocou justamente a norma não na redacção originária da Lei n.º 23/2007, conforme erroneamente se escreveu no aresto em apreço, mas sim na redacção que lhe foi conferida pela Lei n.º 59/2017, de 31 de Julho, e que, até ao presente momento, não sofreu alterações: “1 – Não podem ser afastados coercivamente ou expulsos do País os cidadãos estrangeiros que: c) Tenham filhos menores, nacionais de Estado terceiro, residentes em território português, relativamente aos quais assumam efetivamente responsabilidades parentais e a quem assegurem o sustento e a educação”.
IV – Consta da conclusão Y: “De harmonia com o disposto no artigo 135.º, n.º 1, al. c) da Lei n.º 23/2007, de 4 de Julho, não podem ser expulsos do país cidadãos estrangeiros que tenham filhos menores, residentes em território português, relativamente aos quais assumam responsabilidades parentais e a quem assegurem o sustento e a educação”, não se fazendo referência expressa à Lei n.º 59/2017, mas a verdade é que apresenta o novo texto de forma sincopada.
V – Na verdade, a Lei n.º 59/2017, de 31 de Julho, Diário da República, 1.ª série, n.º 146, de 31-07-2017, procedeu à quarta alteração à Lei n.º 23/2007, alterando os artigos 88.º, 89.º e 135.º, este relativo a limites à expulsão.
Segue o novo texto do artigo 135.º (…) Cotejando esta redacção com a que constava da Lei n.º 29/2012, de 9 de Agosto, transcrita a págs. 51 do acórdão e fls. 1260 dos autos, verifica-se que a actual alínea c) corresponde à alínea b) da versão anterior, com ligeiras alterações sem interferir na substância. Conclui-se, assim, que a versão a aplicar é a actual, a da Lei n.º 59/2017.
VI – 2 – Alteração da qualificação jurídica – Pontos 13 a 16.
Invoca o recorrente omissão de pronúncia relativa a inconstitucionalidade do artigo 16.º, n.º 2, a contrario, da Lei n.º 144/99.
A questão de alteração da qualificação jurídica foi abordada a págs. 55 a 59 do acórdão e fls. 1264 a 1268 dos autos, então se afirmando que não houve qualquer alteração de qualificação jurídica, o que determina a falência de âncora para suscitar inconstitucionalidade, que necessariamente pressupunha a efectiva alteração, como decorre da parte final, onde se afirma que improcede a pretensão recursória condensada nas conclusões EE a LL, onde se abrange naturalmente a conclusão LL, onde foi suscitada a inconstitucionalidade. Improcede a arguição de nulidade por omissão de pronúncia.
VII – 3 – Questões de natureza civil – Pontos 17 a 21.
Aqui o apontado vício situa-se na outra margem. Invocado vem excesso de pronúncia.
Esta questão, sintetizada pelo recorrente nas conclusões MM a SS, foi analisada a págs. 59 a 61, do acórdão ora impugnado, e fls. 1268 a 1270 dos autos.
O recorrente então aduziu que se não verificavam os crimes de burla, de infidelidade e de actividade ilícita de recepção de depósitos, reconduzindo-se as condutas por si perpetradas a meras questões civis.
Começou-se por relembrar que os crimes imputados eram os constantes do pedido de extradição e não os enunciados, frisando-se que não cabia no âmbito dos autos apurar se o extraditando praticou ou não os factos imputados, por o processo de extradição não visar o julgamento dos factos que fundamentam o pedido.
Tratou-se de avançar explicitação de que o que efectivamente em causa está são questões criminais e não do foro do pactum servanda no plano do artigo 405.º do Código Civil, e não será obviamente por aqui que se poderá congeminar a presença do vício apontado, pois que ao afirmar-se que o que está em causa é matéria crime e não civil não se concebe como a tal postura possa ser assacado o conhecimento de questão de que não se podia tomar conhecimento, como injunge a parte final da alínea c) do n.º 1 do artigo 379.º do CPP, tratando-se tão só de uso de linha argumentativa supletiva.
Improcede a arguição de nulidade pro excesso de pronúncia.
VIII – 4 – Inexistência de garantias jurídicas de salvaguarda dos Direitos do Homem – Pontos 22 a 29.
A matéria está compreendida no tema “Pena de prisão perpétua ou de duração indefinida”, vertida nas conclusões TT a QQQ, agora restrito a conclusões HHH a QQQ.
A questão foi abordada a págs. 61 a 63 do acórdão e fls. 1270 a 1272 dos autos, dizendo-se a finalizar: “Improcede o alegado na síntese das conclusões TT a QQQ”.
O recorrente invoca o afirmado na conclusão 23.ª, onde se lê: “… reiterou a informação que já havia prestado oportunamente ao Tribunal da Relação de Lisboa de que os seus sogros haviam sido pressionados pelas autoridades chinesas para que fizessem com que o Recorrente e a sua mulher aceitassem a extradição e regressassem à China”, afirmando verificar-se nulidade por omissão de pronúncia.
Entende o arguente estar em causa uma questão.
O que vem invocado é uma informação prestada pelo recorrente ao Tribunal da Relação de Lisboa.
Pergunta-se, como apreciar o que se contém numa informação prestada pelo interessado, sem passar pelo crivo do contraditório?
Decisão que venha a ser tomada face a uma informação prestada pelo interessado, sem contraditório, estará coberta pelo manto da conformação constitucional?
Decididamente, não nos parece.
Daí que seja de julgar improcedente a arguição de nulidade por omissão de pronúncia.
IX – Concluindo: Feita a correcção quanto à versão da Lei n.º 59/2007, é de indeferir o pedido de declaração de nulidades apresentado pelo recorrente AA.
Fonte: https://www.dgsi.pt