Tribunal da Relação de Lisboa | PROCESSO N.º 2018/20.8YRLSB-2 Resolução Alternativa de Litígios de Consumo
Data
11 de março de 2021
Descritores
Tribunal arbitral
Competência
Consumidor
Contraditório
Sumário
I – A Lei n.º 63/2019, de 16.8, procedeu à quinta alteração à Lei n.º 24/96, de 31.7 (Lei de Defesa do Consumidor), passando a prever-se no artigo 14.º, n.ºs 2 e 3, que os conflitos de consumo de reduzido valor económico (5 000 €) estão sujeitos a arbitragem necessária ou mediação quando, por opção expressa dos consumidores, sejam submetidos à apreciação de tribunal arbitral adstrito aos centros de arbitragem de conflitos de consumo legalmente autorizados.
II – O artigo 12.º, n.º 2, do Código Civil salvaguarda, em parte, o «estatuto do contrato», admitindo que os contratos estão submetidos, em princípio, ao longo de toda a sua vida, à lei vigente no momento da sua conclusão.
III – Porém, no caso estão em causa normas de cariz processual, protecionistas dos consumidores como parte «mais fraca», pelo que a autonomia contratual inerente ao «estatuto do contrato» deve sofrer uma compressão, permitindo-se a aplicação imediata da lei nova.
IV – O processo no Centro de Arbitragem do Sector Automóvel (CASA) tem início com a apresentação da reclamação e pode desenrolar se nas seguintes fases: informação, mediação, conciliação, instrução e arbitragem.
V – Afastada a data da celebração do contrato como leitmotiv da aplicação da lei no tempo, o momento a considerar é o da data da entrada do requerimento de arbitragem e não o momento da reclamação.
VI – O princípio da proteção da confiança deflui de um dos elementos materiais justificadores e imanentes do Estado de Direito: a segurança jurídica dedutível do artigo 2.º da CRP, cuja dimensão subjetiva aponta para a estabilidade, continuidade, permanência e regularidade das situações e relações jurídicas vigentes.
VII – A Lei n.º 63/2019 não preconiza uma mutação da ordem jurídica intolerável e opressiva dos mínimos de certeza e segurança, vindo apenas facultar ao consumidor uma forma adicional mais acessível de fazer valer os seus direitos, não se congeminando uma expetativa da outra parte a uma «decisão fora da arbitragem» tutelável pelo Direito.
VIII – Na falta de acordo entre as partes, os custos das peritagens poderão ser determinados pelo tribunal arbitral, sendo as partes encarregues de caucionar a peritagem, informadas previamente do valor a título de preparos que resulta do «orçamento» apresentado, como se retira das disposições conjugadas dos n.ºs 1 a 6 do artigo 48.º do Regulamento do Centro de Arbitragem do Sector Automóvel.
IX – Quando o n.º 7 do artigo 48.º do Regulamento alude ao cancelamento da perícia por falta de pagamento, contempla, por inferência lógica-jurídica segundo um argumento «a maiori ad minus», a asserção de que a parte que não procedeu ao pagamento do preparo pode ficar impedida de colocar questões ou de pedir esclarecimentos ao perito, inclusive em audiência de julgamento.
X – Segundo o princípio da autorresponsabilidade das partes, as partes sofrem as consequências jurídicas prejudiciais da sua negligência ou inépcia na condução do processo, que fazem a seu próprio risco.
XI – A Reclamada remeteu-se ao silêncio quanto ao objeto das questões submetidas ao Perito, bem como relativamente ao pagamento de metade dos preparos, mesmo depois de advertida de que, no caso de pretender colocar questões, deveria proceder a tal pagamento.
XII – Ao omitir o pagamento de preparo, num caso em que a perícia se traduziu tão-só na audição do Perito em audiência, a parte tinha de contar com uma decisão do Tribunal Arbitral em consonância com a «missão» que definiu para a peritagem (cf. artigo 47.º, n.º 2, alínea b), do referido Regulamento).
XIII – A impugnação da decisão arbitral apenas se pode fazer através do pedido da sua anulação, e nos estritos e taxativos termos e fundamentos do artigo 46.º da Lei da Arbitragem Voluntária, os quais se assumem como vícios ou irregularidades a latere do objeto/mérito do pleito.
Fonte: https://www.dgsi.pt
Comentado em https://novaconsumerlab.novalaw.unl.pt/questoes-sobre-arbitragem-de-consumo-ac-do-trl-de-11-03-2021/